20 janeiro 2008

Farpas

Pela nossa parte não somos monarchicos nem somos republicanos. A fórma constituitiva do poder não nos importa. O problema politico interessa-nos pouco. E n'este ponto achamo-nos inteiramente com o nosso tempo e com a sociedade actual. A questão grave que hoje preoccupa os povos não é de como se ha de distribuir o poder, é de como se ha de distribuir a riqueza. As classes que mais se agitam, as que por toda a parte amedrontam os manutensores da ordem, as que hão de revolver e fixar os destinos das sociedades futuras, não querem empolgar os symbolos do governo, querem simplesmente adquirir os instrumentos do trabalho; querem a terra e querem o capital. O problema moderno é o problema economico. Os reis estão sendo postos ou depostos por toda a parte sem perturbação e sem abalo. Porque? Porque ninguem se interessa em que elles se deixem ficar ou em que elles se vão embora. Voltaire defendia as monarchias com a razão de que preferia servir um leão que tivesse nascido mais forte que elle, a ser devorado por cem ratos da sua especie. Isto era no seculo XVIII, no tempo de Luiz XIV e de Frederico, em que nas monarchias havia o leão e não havia os ratos. No constitucionalismo moderno temos apenas os ratos que nos devoram. O leão é uma pacifica féra embalsamada, inoffensivo ornato de _ètagére_, que os ratos trazem comsigo debaixo do braço e que lhes serve apenas de
pretexto para elles adoptarem esta fórma engenhosa e delicada de nos declararem que lhes appetece roer:--«Meus senhores, o leão pede viveres.»

RAMALHO ORTIGÃO, EÇA DE QUEIROZ
AS FARPAS - CHRONICA MENSAL DA POLITICA DAS LETRAS E DOS COSTUMES
2.º ANNO, Janeiro a Fevereiro de 1873

1 Comments:

Anonymous Hoteles Baratos said...

A Democracia ainda ten moito que mellorar, pero al meno pode facelo entre todos nós.

Saúdos

10:42 da tarde  

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